Saúde mental dos professores deve ser prioridade o ano inteiro

A saúde mental é um tema debatido em campanhas pontuais como o Setembro Amarelo e o Janeiro Branco, por exemplo. Entretanto, precisamos colocar esse tema como prioridade o ano inteiro. No mês em que comemoramos o dia dos/as professores/as, a ADCESP vai promover uma série de reflexões sobre a valorização dos professores, iniciando com o debate sobre saúde mental. Pois os professores passam por situações adversas, seja no ambiente pessoal ou profissional, e isso pode refletir na qualidade da saúde mental, como explica o psicólogo clínico e professor de psicologia da UESPI, Eleonardo Rodrigues: 

 

“Um estudo de 2016, conduzido por Diehl e Marin, relata que de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a categoria de professores, independente da fase de educação, seja ele no ensino infantil, fundamental, médio ou superior, é a categoria mais vulnerável ao adoecimento de doenças físicas como problemas osteomusculares e mentais, isso é um ponto significativo. Nós temos vários professores que estão afastados em sala de aula por motivos de transtornos mentais comuns. Normalmente são conhecidos como ansiedade, depressão, estresse e uma dificuldade de regular suas emoções e sono mediante o contexto que o professor está inserido”, afirma.

 

Eleonardo diz que normalmente o/a professor/a é o elo entre as demandas que a instituição sugere e a realidade das famílias inseridas no contexto social em que vivemos e além disso, alguns fatores podem favorecer o estresse, como a cobrança de produtividade, má gestão do tempo, problemas comportamentais dos estudantes, acompanhamento familiar inadequado, excesso de burocracia e insatisfação no trabalho; além das mudanças que ocorrem na sociedade, por exemplo a pandemia, que trouxe situações de isolamento e nos fez pensar sobre nossa própria existência com a fatal antecipação de mortes de nossos familiares, familiares dos alunos e dos próprios estudantes, nos colocando em situação de luto coletivo. Além da emergente “nova” realidade da educação remota, com suas dificuldades e aprendizados, bem como a competitividade entre colegas de trabalho.

 

Um outro ponto fundamental para o agravamento da saúde mental dos professores é a não efetivação de políticas públicas, já que as condições de trabalho insalubres e ambientes invalidantes, onde os pares não são solidários às demandas, também podem prejudicar a saúde mental dos trabalhadores. “Os professores estão ainda lutando, de uma forma sempre digna, por mais qualidade, tanto salarial quanto também educacional, de estrutura e também da própria universidade”, afirma Eleonardo. 

 

Problemas contingenciais, como o momento de doença, perda familiar ou perda salarial, são questões que favorecem a tensão e o estresse. No ambiente de trabalho, o estresse e cansaço prolongado, mesmo quando os problemas são resolvidos,  pode ser um sinal de esgotamento profissional ou síndrome de Burnout. “Quando o estresse é contínuo ou excessivo passamos a observar nas professoras e professores mudanças comportamentais, exaustão, cansaço, frustração, pressão, irritabilidade e despersonalização, dentro e fora da sala de aula”, afirma o professor Eleonardo.

 

Além desses sinais, o professor ressalta que o perfeccionismo também pode provocar percepções errôneas e prejudicar a saúde mental do professor. “Tem professores e professoras que são mais perfeccionistas, que se cobram muito por um alto e auto desempenhos. Essa cobrança tende, na verdade, a ser um reflexo justamente para que quando ela perceba que não está cumprindo devidamente com a sua qualidade de trabalho, como sempre foi, isso possa vir a provocar uma distorção cognitiva que ela pode ter em relação a sua produtividade: “se não fizer do jeito que sempre fiz, estarei fracassando”. Então, o perfeccionismo, constitui uma característica da personalidade, a pessoa sempre quer fazer o melhor, e por esse motivo tende a adoecer”,explica.

 

As instituições têm que criar condições que contemplem programas de apoio psicológico ou psiquiátrico de forma contínua e não apenas em campanhas pontuais como o setembro amarelo e o janeiro branco, por exemplo.  Os setores de recursos humanos também devem estar atentos às queixas mais comuns dos docentes, através das coordenações de curso e do sindicato. “É importante ficar atento às reclamações, às queixas, no sentido de poder favorecer esse trabalho fundamental. Acho que outro ponto que a gente pode levar em consideração é justamente favorecer também o encontro das docentes e docentes, em datas significativas como Carnaval, como São João, fim de ano, etc. Isso favorece a alegria, o bem-estar e faz com que a saúde mental se torne mais solidificada.”, finaliza Eleonardo.

 

O/a professor/a deve conhecer suas próprias emoções, para que possa identificar seus limites e respeitá-los. Precisamos também pensar que mente e corpo não são separados, então ter saúde física é primordial para uma boa saúde mental e vice-versa. Em caso de continuidade no sofrimento mental, procure ajuda profissional. “Falar pode mudar tudo!”

 

Grupo de Trabalho de Seguridade Social e Assuntos de Aposentadoria do ANDES-SN debate sobre a saúde mental dos professores 

 

Reconhecendo que a pandemia modificou as condições de trabalho dos professores e evidenciou o adoecimento mental da categoria, o Grupo de Trabalho de Seguridade Social e Aposentadoria (GTSSA) do Sindicato Nacional de Docentes do Ensino Superior (ANDES-SN) incluiu temas de saúde mental em seus encontros e debates.

 

Segundo Elizabeth Vasconcelos, 1ª vice-presidente do ANDES-SN (Regional RJ) e coordenadora do GTSSA, o grupo pretende coletar dados nacionais sobre o adoecimento mental dos docentes a fim de produzir cartilhas, construir seminários e ações para efetivamente lutar por condições de trabalho e saúde do trabalhador docente.

 

“A gente tem poucos dados sobre isso nacionalmente e acho que esse período pandêmico que estamos vivendo aprofundou e muito as nossas condições de trabalho. O isolamento social, o ensino remoto, o ensino híbrido, de levar pra dentro da nossa casa aquilo que é do nosso trabalho, a gente misturou, né? A nossa vida privada, com a vida pública nossa, com o nosso trabalho e acho que isso aprofundou muito mais. Nós docentes temos uma dificuldade muito grande de entender o nosso adoecimento”, afirma.