Por: José da Cruz Bispo de Miranda Professor da UESPI
As demandas sociais da comunidade negra internacional têm tido grande repercussão no mundo, contudo, no Brasil, o seu resultado foi a publicação da Portaria do Ministério da Educação (MEC) nº 45/2020, revogando a de nº 13/2020 que permitia a reserva de vagas para negros e negras na pós-graduação, a reafirmação de que em 2022 a Lei nº 12.711/2012 (a Lei de cotas para negros e negras no ensino superior será avaliada) e a continuidade de assassinatos de jovens negros por parte da polícia.
No Piauí, as manifestações antirracistas não são suficientes para lembrar que a Lei Estadual nº 5.791/2008 (Lei de reserva de cotas sociais para o ensino superior público no Estado do Piauí) não inclui cotas para negros e negras, apenas a Resolução do Conselho Universitário da Universidade Estadual do Piauí(UESPI) nº 08/2008 é que amplia a interpretação e cria as condições de implantar as reservas de cotas raciais, que teve início em 10%(5% para cota escola pública e 5% para cota para negros e negras oriundos de escola pública), chegando a 30% (15% para escola pública e 15% para negros e negras).
O que existe no cenário social, cultural e político piauiense que não permite o avanço de conquistas da comunidade negras na legislação estadual que resulte, no mínimo, na equivalência da Lei Estadual nº 5.971/2008 à Lei 12.711/2012, que institui 50% de reserva de vagas para cotas no ensino público federal, sendo 25% para escola pública e 25% para negros e negras? Nós temos uma Universidade Pública Estadual com pensamento mais conservador que todas as outras brasileiras? E nós professores negros e negras da UESPI negamos a debater o assunto porque imaginamos que a Administração Superior não é simpática à equivalência de nossa Resolução à lei federal? Nossos/as legisladores/as acreditam que defender cotas para negros e negras na Assembleia Legislativa Estadual os condenará a perda de votos? Ou não têm a convicção que essa seja a melhor política para diminuir a desigualdade racial no país?
Inicialmente contatar que a existência da Lei Estadual nº 5.791/2008 (que ignora as cotas para negros e negras) e da Resolução da UESPI, única Instituição de Ensino Superior Pública do Estado, que não permite o aumento para 50% de reserva de vagas para cotas escola pública e raciais (equivalência à Lei Federal nº 12.711/2012) nos leva ao semelhante posicionamento conservador do ex-ministro da educação, Abraham Weintraub, em não favorecer políticas inclusivas da comunidade negra no ensino superior.
Provavelmente nossos representantes estão a crer nos dados que apontam que os negros e as negras são maioria no ensino superior. Após a execução da Lei de cotas no ensino superior por 6 anos sem a comissão de heteroidentificação no Sistema de Seleção Unificado (SISU), sem a qual aceitava-se apenas a autodeclaração e, por isso resultou num alto índice de fraude, ou seja, pessoas brancas beneficiadas com uma política que não era para elas e, num cenário, em que a autodeclaração não segue regras, apenas a vontade de auto atribuir uma identidade que gere direitos e facilidades.
Ainda, em 2018, o Sistema de Indicadores Sociais, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) afirmava que apenas 25,2% dos jovens brasileiros, entre 18 a 24 anos, estavam no ensino superior, destes 36,1% eram brancos e 18,3% eram negros e negras. Se considerarmos que o número de vagas no ensino superior no Piauí é um dos menores do país e, que a população negra piauiense é de 70,7% (IBGE, 2018) é de se constatar que a não equivalência das leis estaduais sobre cotas à Lei Federal nº 12.711/2012 está condenando no Estado do Piauí, em menor grau em outros estados, possivelmente, negros e negras à exclusão ao ensino superior público. Por que isso? Aparentemente não vejo explicações.
Estamos no quarto mandato de um governo do Partido dos Trabalhadores, sendo governador indígena nos quatro mandatos (O Piauí tem índio sim), a Assembleia legislativa, atualmente tem 9 deputados do Partido dos Trabalhadores (PT) e Partido Comunista do Brasil (PC do B), além disso, a coalizão do governo é majoritária.
Vale destacar o argumento de que nem sempre ser do PT ou PC do B significa comprometido com setores marginalizados, neste caso, os negros e negras, muitos desses representantes têm a convicção de que o preconceito e discriminação contra negros e negras é social, ou seja, ocorrem por sermos pobres, não por nossa condição de ser negro ou negra. Provavelmente esse mesmo pensamento seja hegemônico na UESPI, que durante 12 anos se acomoda alocar 70% das vagas para concorrência ampla, beneficiando os alunos e alunas oriundos/as das escolas particulares e dos cursinhos preparatórios. Há algo estranho no Piauí.
O Partido dos Trabalhadores tem alguns nós, no âmbito nacional, não favoreceu à reestruturação das polícias brasileiras, tornando-as mais repressoras e violentas, no âmbito estadual, destaco, a omissão na questão das cotas para negros e negras no ensino superior público.